Entrevista ao Professor Carlos Costa! Parte 1

janeiro 28, 2018
O post de hoje consistirá numa entrevista que eu tive o privilégio de fazer ao professor Carlos Costa. A entrevista estará dividida em 2 partes.

Antes de mais gostaria de agradecer a disponibilidade do professor Carlos Costa para realizar esta entrevista. É de extrema importância para os jovens terem os conselhos de alguém com a formação e experiência do professor. A temática da entrevista será a importância da faculdade para o desenvolvimento de competências profissionais e pessoais.

Carlos Costa é Professor Associado no ISEG (Lisbon School of Economics and Management), Universidade de Lisboa, desde Setembro de 2017. Carlos Costa é membro da IEEE e ACM. É ainda chair da EuroSIGDOC/ACM. Foi presidente da comissão científica de conferencias patrocinadas pela ACM e EuroSIGDOC/ACM. Carlos é doutorado em Ciências e Tecnologias da Informação, no ramo de Sistemas de Informação e Bases de Dados pelo ISCTE, é mestre em Ciências de Gestão pela mesma universidade e licenciado em A.G.E. pela Universidade Católica Portuguesa.

1. Frequentemente, alunos de licenciatura queixam-se da falta de conhecimento a nível prático, considera esta situação uma realidade nos dias de hoje? Acredita que a articulação entre empresas e faculdades é suficiente ou existem pontos a melhorar?

Antes de mais obrigado pelo gentil convite para esta entrevista.
Essa primeira pergunta na realidade envolve vários aspetos.
Quanto à falta de conhecimentos práticos, há que começar por identificar qual o papel da universidade. Eu acho que acima de tudo a universidade deve dar uma formação teórica (e mesmo ética) que vai para além da simples resolução dos problemas imediatos. Uma licenciatura não deve perder a validade ao fim de um ano de conclusão, porque se focou na prática. A licenciatura deve dar uma boa formação de base.
Da experiência que tenho, é preciso ter muito cuidado com o tipo de relação que se estabelece com as empresas. Nem todas as empresas são iguais. Particularmente com o desenvolvimento outsourcing, erradamente confundido com a consultoria, existem empresas que apenas servem de intermediários.
Por outro lado, um dos problemas típicos é que a generalidade das empresas  dão muito pouco (ou nada) às universidades e aos professores. Não existe qualquer incentivo para os professores saírem da sua zona de conforto, reunirem com empresas e desenvolverem trabalho em conjunto. Em geral, nem os alunos (que são os mais beneficiados) dão valor a esse esforço. Chamo a atenção que esses incentivos podem não ser necessariamente de natureza financeira. Podem consistir no acesso a dados e ferramentas para desenvolvimento de investigação.
Apesar disso, acho que há alguns professores que investem imenso nessas iniciativas. Embora insuficiente, nomeadamente devido aos tais entraves.
Quanto a iniciativas a desenvolver  acho que ao nível das pós-graduações, há lugar a desenvolvimento de cursos em conjunto. Outra iniciativa relevante é a colaboração a nível de projetos de fim de curso e estágios. Tenho boas experiências neste último tipo de iniciativas.


2. Acredita que a nova geração de licenciados está preparada para lidar com a cada vez maior
introdução das inteligências artificiais no modelo de negócio das empresas?

Depende dos cursos que estamos a falar. Obviamente que aqui assumo claramente que sou faccioso. Acho que os cursos de gestão do ISCTE e da Nova são muito fracos nessas temáticas. As licenciaturas do ISCTE tinham uma boa formação em informática, que foi reduzida substancialmente com Bolonha. Exceção seja feita a GEI, posteriormente GIL.  “Puxando a brasa à minha sardinha”, a licenciatura de gestão do ISEG tem muito boas potencialidades nesse espaço.
Em contrapartida, têm-se desenvolvido muitas licenciaturas em Informática. Por exemplo, em Lisboa, as Universidades dão uma grande oferta de licenciaturas em Engenharia Informática: no Técnico, no ISCTE, na FCT da Nova e na Faculdade de Ciências.  Existe ainda a excelente licenciatura de IGE e as licenciaturas do ISEGI, sem contar o ISEL e as Universidades privadas. Obviamente que no resto do país há muitos bons exemplos, mas em Lisboa existe uma quantidade e qualidade de formação que é muito relevante. Tenho receio que os cursos tradicionais de gestão não tenham acompanhado o dinamismo da Informática.


3. Considera a faculdade um passo essencial para todos os percursos de vida bem-sucedidos?

Acho essencial. Esse aspeto pode ser analisado quer ao nível de formação geral quer de formação técnica.
Em termos de formação geral, há determinados dimensões que só temos acesso formal através da universidade. A universidade permite ainda abrir os horizontes para tópicos que de outra forma não iriam ser explorados. Algumas pessoas dizem que está tudo na Internet. Mas a Internet não nos desenvolve hábitos de trabalho, espírito critico em relação à informação encontrada  e rigor. Também não nos obriga a abrir horizontes para tópicos que nós à partida não estaríamos interessados em explorar. Não estamos a falar de cursos on-line, essa é outra matéria.
Em termos de formação técnica não conheço todas as áreas, Mas acho que na Saúde e no Direito é inconcebível não haver formação superior. Acho que a gestão também é essencial, aqui quer ao nível da licenciatura quer mestrado como complemento de outras áreas. Na informática também. Essa então é uma área em que a formação superior é cada vez mais relevante, dada a complexidade crescente. Se aqui há uns anos era fácil a um licenciado em qualquer área de engenharia ou a em gestão entrar em informática, hoje é cada vez mais complexo. Em áreas artísticas, não conheço suficientemente, quer a qualidade da formação quer a relevância. Mas estou em crer que se aplica o mesmo que naquelas que conheço melhor.
O problema que acontece muitas vezes é no desajustamento entre formação que se tem e as necessidades do mercado do trabalho.


4. Na sua opinião os alunos de secundário estão bem preparados para entrar no ensino
superior ou existe espaço para melhorar?

É lugar comum dizer-se que os alunos vêm cada vez pior preparados. Não tenho noção que exista essa tendência. Existem ciclos. Mas mais importante é virem para a universidade com mente aberta. Particularmente na informática durante muito tempo existia um processo de desconstrução. Os estudantes vinham para a universidade convencidos que eram uns magos da informática. Passado pouco tempo chegavam à conclusão que informática não era bem o que eles pensavam ser. Hoje em dia já sabem que um curso de informática (ou engenharia informática) é um curso difícil e trabalhoso. Acho que é preciso vir com essa atitude de arregaçar as mangas. Isso é que é o essencial.

Mindset

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