Entrevista ao Professor Carlos Costa! Parte 1
O post de hoje consistirá numa entrevista que eu tive o privilégio de fazer ao professor Carlos Costa. A entrevista estará dividida em 2 partes.
Antes de mais gostaria de agradecer a disponibilidade do professor Carlos Costa para realizar esta entrevista. É de extrema importância para os jovens terem os conselhos de alguém com a formação e experiência do professor. A temática da entrevista será a importância da faculdade para o desenvolvimento de competências profissionais e pessoais.
Carlos Costa é Professor Associado no ISEG (Lisbon School of Economics and Management), Universidade de Lisboa, desde Setembro de 2017. Carlos Costa é membro da IEEE e ACM. É ainda chair da EuroSIGDOC/ACM. Foi presidente da comissão cientÃfica de conferencias patrocinadas pela ACM e EuroSIGDOC/ACM. Carlos é doutorado em Ciências e Tecnologias da Informação, no ramo de Sistemas de Informação e Bases de Dados pelo ISCTE, é mestre em Ciências de Gestão pela mesma universidade e licenciado em A.G.E. pela Universidade Católica Portuguesa.
1. Frequentemente, alunos de
licenciatura queixam-se da falta de conhecimento a nÃvel prático, considera
esta situação uma realidade nos dias de hoje? Acredita que a articulação entre empresas e
faculdades é suficiente ou existem pontos a melhorar?
Antes de mais obrigado
pelo gentil convite para esta entrevista.
Essa primeira pergunta na
realidade envolve vários aspetos.
Quanto à falta de
conhecimentos práticos, há que começar por identificar qual o papel da universidade.
Eu acho que acima de tudo a universidade deve dar uma formação teórica (e mesmo
ética) que vai para além da simples resolução dos problemas imediatos. Uma
licenciatura não deve perder a validade ao fim de um ano de conclusão, porque
se focou na prática. A licenciatura deve dar uma boa formação de base.
Da experiência que tenho,
é preciso ter muito cuidado com o tipo de relação que se estabelece com as
empresas. Nem todas as empresas são iguais. Particularmente com o
desenvolvimento outsourcing, erradamente confundido com a consultoria, existem
empresas que apenas servem de intermediários.
Por outro lado, um dos
problemas tÃpicos é que a generalidade das empresas dão muito pouco (ou nada) à s universidades e
aos professores. Não existe qualquer incentivo para os professores saÃrem da
sua zona de conforto, reunirem com empresas e desenvolverem trabalho em
conjunto. Em geral, nem os alunos (que são os mais beneficiados) dão valor a
esse esforço. Chamo a atenção que esses incentivos podem não ser
necessariamente de natureza financeira. Podem consistir no acesso a dados e
ferramentas para desenvolvimento de investigação.
Apesar disso, acho que há
alguns professores que investem imenso nessas iniciativas. Embora insuficiente,
nomeadamente devido aos tais entraves.
Quanto a iniciativas a
desenvolver acho que ao nÃvel das
pós-graduações, há lugar a desenvolvimento de cursos em conjunto. Outra
iniciativa relevante é a colaboração a nÃvel de projetos de fim de curso e
estágios. Tenho boas experiências neste último tipo de iniciativas.
2. Acredita que a nova
geração de licenciados está preparada para lidar com a cada vez maior
introdução das
inteligências artificiais no modelo de negócio das empresas?
Depende dos cursos que
estamos a falar. Obviamente que aqui assumo claramente que sou faccioso. Acho
que os cursos de gestão do ISCTE e da Nova são muito fracos nessas temáticas.
As licenciaturas do ISCTE tinham uma boa formação em informática, que foi
reduzida substancialmente com Bolonha. Exceção seja feita a GEI, posteriormente
GIL. “Puxando a brasa à minha sardinha”,
a licenciatura de gestão do ISEG tem muito boas potencialidades nesse espaço.
Em contrapartida, têm-se
desenvolvido muitas licenciaturas em Informática. Por exemplo, em Lisboa, as
Universidades dão uma grande oferta de licenciaturas em Engenharia Informática:
no Técnico, no ISCTE, na FCT da Nova e na Faculdade de Ciências. Existe ainda a excelente licenciatura de IGE
e as licenciaturas do ISEGI, sem contar o ISEL e as Universidades privadas.
Obviamente que no resto do paÃs há muitos bons exemplos, mas em Lisboa existe
uma quantidade e qualidade de formação que é muito relevante. Tenho receio que
os cursos tradicionais de gestão não tenham acompanhado o dinamismo da
Informática.
3. Considera a
faculdade um passo essencial para todos os percursos de vida bem-sucedidos?
Acho essencial. Esse
aspeto pode ser analisado quer ao nÃvel de formação geral quer de formação
técnica.
Em termos de formação
geral, há determinados dimensões que só temos acesso formal através da
universidade. A universidade permite ainda abrir os horizontes para tópicos que
de outra forma não iriam ser explorados. Algumas pessoas dizem que está tudo na
Internet. Mas a Internet não nos desenvolve hábitos de trabalho, espÃrito
critico em relação à informação encontrada
e rigor. Também não nos obriga a abrir horizontes para tópicos que nós Ã
partida não estarÃamos interessados em explorar. Não estamos a falar de cursos
on-line, essa é outra matéria.
Em termos de formação
técnica não conheço todas as áreas, Mas acho que na Saúde e no Direito é
inconcebÃvel não haver formação superior. Acho que a gestão também é essencial,
aqui quer ao nÃvel da licenciatura quer mestrado como complemento de outras
áreas. Na informática também. Essa então é uma área em que a formação superior é
cada vez mais relevante, dada a complexidade crescente. Se aqui há uns anos era
fácil a um licenciado em qualquer área de engenharia ou a em gestão entrar em
informática, hoje é cada vez mais complexo. Em áreas artÃsticas, não conheço
suficientemente, quer a qualidade da formação quer a relevância. Mas estou em
crer que se aplica o mesmo que naquelas que conheço melhor.
O problema que acontece
muitas vezes é no desajustamento entre formação que se tem e as necessidades do
mercado do trabalho.
4. Na sua opinião os
alunos de secundário estão bem preparados para entrar no ensino
superior ou existe
espaço para melhorar?
É lugar comum dizer-se
que os alunos vêm cada vez pior preparados. Não tenho noção que exista essa
tendência. Existem ciclos. Mas mais importante é virem para a universidade com
mente aberta. Particularmente na informática durante muito tempo existia um
processo de desconstrução. Os estudantes vinham para a universidade convencidos
que eram uns magos da informática. Passado pouco tempo chegavam à conclusão que
informática não era bem o que eles pensavam ser. Hoje em dia já sabem que um
curso de informática (ou engenharia informática) é um curso difÃcil e
trabalhoso. Acho que é preciso vir com essa atitude de arregaçar as mangas.
Isso é que é o essencial.
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